quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Paulo Freire e as esquerdas na sala

Esta postagem é um trecho modificado de um trabalho de classe (daquela professora que me humilhou) em que fui obrigado a ler um capítulo do livro Pedagogia do oprimido, do nosso conhecido inimigo da verdade, e fazer uma “reflexão” sobre ele. Não que não devamos ler as sentenças dos famigerados impostores e loucos, mas as conseqüências do ensino de Paulo Freire são tão profundas e tem causas tão remotas que as considerações a ser feitas merecem um estudo mais dedicado. Mesmo com o meu pouco estudo, creio que as observações feitas e a bibliografia usada podem auxiliar ou ao menos nortear outros estudantes da educação que percebam a necessidade de combater a hegemonia dos ensinos de Freire na academia.

O capítulo em questão pergunta se a educação deve servir à transformação ou à reprodução. Mesmo sem saber se há ou se deve haver transformação ou reprodução de quê ou de quem, pois o autor se abstém de aprofundar os termos, creio ser relevante comparar a “doença” diagnosticada pelo autor, sua causa e seu “remédio” à realidade do ensino no país.

O capítulo Educação: reprodução ou transformação?, do livro Pedagogia do oprimido, de Paulo Freire, me surpreendeu em vários aspectos. Primeiramente, há uma falta de aptidão argumentativa exagerada quando comparado à bibliografia restante da matéria. Os conceitos usados pelo autor são tão vagos que o único aspecto tratado que faz eco na realidade é a constatação da “educação tecnocrática” promovida pelo governo militar em seus centros de ensino. Sinto me impelido a conhecer mais sobre o assunto, pois até agora não sei até que ponto devo me opor ou apoiar tal tipo de educação.

Mas o que mais me surpreendeu foi o fato de que Paulo Freire influenciou a educação atual de tal forma que há um imenso paradoxo entre a realidade atual e o texto do autor: a “transformação” defendida ontem pelo autor acabou por tornar-se a “reprodução” de hoje, se é que entendi o sentido destes termos na leitura de um só capítulo.

Porque e como isso ocorreu

Creio não ser preciso provar que, na maior parte o século 20, o pensamento de esquerda foi majoritário em nossas universidades públicas, as principais formadoras de pensadores. Estes intelectuais passaram de majoritários a dominantes nas universidades, pois a esquerda havia perdido no seu front armado após a revolução de 64, preferindo então investir nos planos de longo prazo. Deu certo. Soma-se a isso o fato de os militares pretenderem promover o utópico pragmatismo supra-ideológico1 no país, combatendo a ideologia apenas em seu âmbito jornalístico e parcamente no artístico através da censura de suas formas mais radicais. O alardeado “pensamento conservador de direita” esteve longe de ser apoiado institucionalmente, ou seja, não foi usado como forma de “combate”. O aspecto “tolerante” dos militares é provado pela própria edição do livro do autor em questão em meados dos anos 70.

Contando com a quase ausência do pensamento crítico do marxismo e com pouca ênfase em alternativas a este2, pois não foram apoiados por nenhum setor expressivo da sociedade, o pensamento de esquerda se tornara dominante na academia. Não demorou muito para que os livros didáticos e a mente dos nossos professores aderissem à causa. O apoio institucional viera a partir da chegada de um teórico marxista à presidência da república, em meados dos anos 90.

Sabemos que o cientista humano que se presume neutro, na verdade se põe acima de todas as ideologias sem se dar ao trabalho de entendê-las. Mesmo consciente da impossibilidade da neutralidade, creio que seja (ou deveria ser) dever do educador informar que este ou aquele autor ou corrente de pensamento ensinado é contestado por outros e quais são estes outros, para não oferecer ao aluno uma só visão de mundo, como a que recebi.

Para dar provas do quanto o ensino brasileiro se enviesou através dos livros didáticos e dos ensinamentos dos professores, usarei os livros didáticos da série Nova História Critica, de Mário Schimidt. Este é um dos exemplos mais gritantes de livros didáticos com viés político acentuado. É preciso advertir que está excluído como prova o viés político dos professores, quesito abordado com propriedade no artigo Prontos para o Século XIX, de Monica Weinberg e Camila Pereira3.

Selecionei os mesmos fragmentos de textos de um artigo4 do site Escola Sem Partido para demonstrar que nossos livros didáticos se dividem em esquerdistas radicais e moderados. O Nova História Critica é um exemplo do primeiro.

“Sobre Mao Tse-tung: ‘Foi um grande estadista e comandante militar. Escreveu livros sobre política, filosofia e economia. Praticou esportes até a velhice. Amou inúmeras mulheres e por elas foi correspondido. Para muitos chineses, Mao é ainda um grande herói. Mas para os chineses anticomunistas, não passou de um ditador.’”

Elogiar um ditador sangrento, responsável pela morte de no mínimo 50 milhões de pessoas5 omitindo o fato é um sinal claro que o autor deseja formar jovens militantes radicais.

“Sobre a Revolução Cultural Chinesa: ‘Foi uma experiência socialista muito original. As novas propostas eram discutidas animadamente. Grandes cartazes murais, os dazibaos, abriam espaço para o povo manifestar seus pensamentos e suas críticas. Velhos administradores foram substituídos por rapazes cheios de idéias novas. Em todos os cantos, se falava da luta contra os quatro velhos: velhos hábitos, velhas culturas, velhas idéias, velhos costumes. (...) No início, o presidente Mao Tse-tung foi o grande incentivador da mobilização da juventude a favor da Revolução Cultural. (...) Milhões de jovens formavam a Guarda Vermelha, militantes totalmente dedicados à luta pelas mudanças. (...) Seus militantes invadiam fábricas, prefeituras e sedes do PC para prender dirigentes 'politicamente esclerosados'. (...) A Guarda Vermelha obrigou os burocratas a desfilar pelas ruas das cidades com cartazes pregados nas costas com dizeres do tipo: 'Fui um burocrata mais preocupado com o meu cargo do que com o bem-estar do povo.' As pessoas riam, jogavam objetos e até cuspiam. A Revolução Cultural entusiasmava e assustava ao mesmo tempo.’”

É amplamente conhecido que a Revolução Cultural impediu qualquer manifestação intelectual, didática ou artística que não elogiasse o PC chinês e fez entre 400 mil e 1 milhão de mortos6.

“Sobre a Revolução Cubana e o paredão: ‘A reforma agrária, o confisco dos bens de empresas norte-americanas e o fuzilamento de torturadores do exército de Fulgêncio Batista tiveram inegável apoio popular.’”

O “inegável apoio popular” não é difícil conseguir quando mais 77 mil cubanos morreram tentando fugir do país, sem contar os milhares de mortos fuzilados, assassinados extrajudicialmente, presos políticos mortos no cárcere por maus tratos, por falta de assistência médica ou por doenças da velhice e guerrilheiros anticastristas mortos em combate7.

“Sobre os motivos da derrocada da URSS: ‘É claro que a população soviética não estava passando forme. O desenvolvimento econômico e a boa distribuição de renda garantiam o lar e o jantar para cada cidadão. Não existia inflação nem desemprego. Todo ensino era gratuito e muitos filhos de operários e camponeses conseguiam cursar as melhores faculdades. (...) Medicina gratuita, aluguel que custava o preço de três maços de cigarro, grandes cidades sem crianças abandonadas nem favelas... Para nós, do Terceiro Mundo, quase um sonho não é verdade? Acontecia que o povo da segunda potência mundial não queria só melhores bens de consumo. Principalmente a intelligentsia (os profissionais com curso superior) tinham (sic) inveja da classe média dos países desenvolvidos (...) Queriam ter dois ou três carros importados na garagem de um casarão, freqüentar bons restaurantes, comprar aparelhagens eletrônicas sofisticadas, roupas de marcas famosas, jóias. (...) Karl Marx não pensava que o socialismo pudesse se desenvolver num único país, menos ainda numa nação atrasada e pobre como a Rússia tzarista. (...) Fica então uma velha pergunta: e se a revolução tivesse estourado num país desenvolvido como os EUA e a Alemanha? Teria fracassado também?’”

Este “sonho” custou 20 milhões de vidas5. E a inveja não pode ocasionar a ruína de um sistema econômico fadado ao fracasso, segundo nos ensinaram os economistas austríacos Ludwig Von Mises e Eugen Von Böhm-Bawerk.

Foram distribuídos, entre 1998 e 20078, 9 milhões de exemplares deste livro para alunos da 5ª à 8 séries do ensino fundamental. Como o PNLD9 compra livros de três em três anos, o livro comprado é usado por três alunos. Portanto, no mínimo 21 milhões de alunos os livros da coleção “Nova História Crítica”. Em 2007 o livro foi excluído da lista dos recomendados pelo MEC por apresentar “problemas conceituais”.

Em uma nota10 emitida em setembro de 2007, o MEC informa que a avaliação dos livros didáticos é feita por uma comissão de professores-doutores, e que todos os professores do ensino público deve escolher um dentre uma lista de livros recomendados. O MEC não informa quantos há nesta lista. Faz parte dos critérios5 de aprovação o de que o livro não pode expressar preconceito ou doutrinação.

A julgar pelos dados, a academia, por meio dos professores da comissão, e o Estado são responsáveis e concordaram com a distribuição de 9 milhões de exemplares do livros durante 9 anos.

Conclusão

A questão sobre se há ou quando há reprodução ou transformação na educação torna-se irrelevante quando comparada às mortes, às vidas despedaçadas e às crianças alienadas geradas pelas revoluções culturais citadas e o ensino doutrinário. Portanto, preferi não considerar isoladamente as sentenças do autor nesse trabalho porque sua importância é ofuscada pelos fatos expostos. Discorrer sobre a influência de Freire não foge do assunto e denuncia o que deveria ser patente.

Quanto ao livro usado como exemplo, temos certeza de que a maioria dos professores da comissão do MEC, funcionários responsáveis do MEC e o próprio autor têm como guru o escritor Paulo Freire. Mesmo no texto fica clara uma posição que Freire assume noutra parte do livro: que “a revolução cultural” – obviamente nos moldes de Antonio Gramsci – “é o máximo de conscientização possível que deve desenvolver o poder revolucionário, com o qual atinja a todos, não importa qual seja a sua tarefa a cumprir” (pág. 186). Segundo estas palavras, as revoluções culturais ocorridas na Alemanha nazista e na China são boas e desejáveis. Cuba, Coréia do Norte e outros países comunistas decerto experimentaram mudanças que poderiam ser classificadas como revoluções culturais, mas a documentação e a análise desses fatos são insuficientes.

É sabido que também em Cuba o ensino e a cultura deste país estão longe de ser transformadores, pelo contrário, se parece muito com o ensino e os costumes que os grandes tiranos e ditadores impuseram em seus domínios para que a população não se rebelasse. Como então a teoria e o método do autor em questão pode ser tão usado no nosso país? Esta é uma manifestação do paradoxo citado no início do texto. Esse paradoxo só pode ser explicado por Lênin – “teórico” muito usado pelo autor – quando ele prescreve aos camaradas: “Acuse-os do que você é”.

Porém, sem dúvidas quanto aos significados dos conceitos usados pelo autor, podemos afirmar que a educação de alunos e educadores no Brasil obedece a uma reprodução com poucas diferenças fenotípicas e precisa, não forçosamente de uma transformação, mas de uma reforma que resgate o que os grandes educadores do passado aprenderam e quiseram nos ensinar.

Como simpático à educação liberal­11, que decerto cumpre aquele resgate, a “educação tecnocrática” parece ser um ultraje à maturidade do aluno e à sua vontade de conhecer, mas a pedagogia proposta pelo autor, que substituiu a implantada pelos militares, tem deficiências estruturais infinitamente mais nocivas que a anterior. Como amostra casual, temos a defesa velada e explícita pelo fim da responsabilidade do aluno sobre seu aprendizado e pela proibição de que as noções de certo e errado sejam ensinadas a crianças e jovens.

É fato que ser um educador totalmente imparcial é impossível, mas a pluralidade de pensamentos instiga o aluno e proporciona um saudável debate sobre idéias e fatos não só na educação, mas entre os homens públicos, acadêmicos e artistas.

Ficam então a perguntas: não será melhor e mais eficiente promover a autonomia intelectual e a maturidade do aluno do que formar um eterno “transformador social” ou um peão de qualquer outro jogo? Em vez de obrigar o aluno a olhar para a esquerda ou a direita, porque não o ajudamos a olhar para cima? Não só na busca pelo Deus eterno e infinito, mas para olhar os fatos e coisas desde cima, sem que nada lhe seja oculto por vontade humana.

Bibliografia e Notas

1- Carvalho, O. de. Miséria intelectual sem fim Disponível em: http://www.olavodecarvalho.org/semana/070910dc.html. Acesso em 21/11/2008;

2- Carvalho, O. de. A ideologia da anti-ideologia. Disponível em: www.olavodecarvalho.org/semana/050815dc.htm. Acesso em 21/11/2008;

3- http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,article,2,239,sid,1,ch

4- Escola Sem Partido. O que ensinam a nossas crianças. http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,article,2,182,sid. Acesso em 21/11/2008;

5- Courtois, Stephane et al.; O Livro Negro do Comunismo: crime, terror e repressão. 4a edição; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005 pp. 17;

6- Sociedade Católica. O livro negro do comunismo. Disponível em: http://www.sociedadecatolica.com.br/modules/smartsection/makepdf.php?itemid=249. Acesso em 21/11/2008;

7- Carvalho, O. de. Cuba em números. Disponível em: http://www.olavodecarvalho.org/semana/040807globo.htm. Acesso em 25/11/2008;

8- Escola Sem Partido. Lata de lixo da História. Disponível em: http://www.escolasempartido.org/index.php?id=38,1,article,2,190,sid,1,ch Acesso em 25/11/2008; O Estado de São Paulo. 20 milhões usaram livros de história rejeitados pelo MEC. Disponível em: http://www.estadao.com.br/vidae/not_vid54779,0.htm; e Escola Sem Partido. Em dez anos, 20 milhões de alunos usaram livro polêmico. Disponível em: http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,print,2,191,sid,1,ch. Acesso em 25/11/2008;

9- Programa Nacional do Livro Didático;

10- Revista de História da Biblioteca Nacional. História ou ideologia? Disponível em: www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=1136. Acesso em 25/11/2008.

11- http://educacaoliberal.wordpress.com/ ou http://aristoi.wordpress.com/


4 comentários:

  1. Aconselho a leitura do livro MAO: A HISTÓRIA DESCONHECIDA (Companhia das Letras), de Jung Chang e Jan Halliday. Mao não era um homem, era um demônio.

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  2. Obrigado, anônimo. Realmente é difícil imaginar homem ou até personagem de ficção que exceda Mao em matéria maldade. Decerto a palavra Maodade teria um sentido mais profundo para nós e os fonemas ainda seriam os mesmos.

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  3. LHE ACONSELHO A PRIMEIRAMENTE "TENTAR" CONSTRUIR SUA RUPTURA EPISTEMOLÓGICA E RESOLVER SEU PARADIGMAS E TAMBÉM SEUS PROBLEMAS ANTES DE CONTESTAR UM DOS AUTORES MAIS PRIVILEGIADOS EM TERMOS DE EDUCAÇÃO, UMA OBRA BÉLISSIMA ONDE PESSOAS QUE NÃO TEM UM PINGO DE HUMANIDADE NÃO SABEM O QUE FALAM.RESOLVA SEUS PROBLEMAS ANTES DE CRITICAR.

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  4. Putz grila! Ter de fazer com que os leitores dos blogs leiam tais parvoíces publicando este tipo de comentários é chato, mas é preciso fazê-lo pra ver se o nível aumenta. O comentário já começa com um erro rasteiro do português. "LHE aconselhar"? Saber a regência de todos os verbos não é fácil, mas de um tão usado como "aconselhar" é só pra quem só lê anúncio ou lê muito e nada aprende. Aconselhar é verbo transitivo direto, analfabeta! Sei que a culpa não é totalmente sua, Emilene, pois são a imensa maioria os professores de letras que trocam seus romances, poesias e gramáticas pela implantação da "revolução cultural" de Freire entre os alunos e pelo seu método plagiado. Não é você que é burra ou analfabeta, é o Brasil. E te asseguro (TE, não LHE) que luto contra a minha burrice, pois quem mora no Brasil tem que admiti-la para escrever algo que valha a pena ser lido. Acho que é isso que LHE (agora sim!) falta, e não te recomendo eu para saná-la, mas o professor e filósofo Olavo de Carvalho.

    Epistemologia? Paulo Freire não chega aos pés do pior filósofo que haja em um dicionário de filosofia. Duvido que Freire teria capacidade de debater a epistemologia d'alguma ciência. Nem eu. Duvido ainda mais que você o faça, se é que você sabe o que é epistemologia. Esta linguagem mista de cientificismo e psicologismo não impressiona ninguém. O mau gosto é tanto que nem o pobre Freire a utiliza.

    Aos leitores: Por favor, me contestem! Contestem-me, mas façam algo bem feito. Não escrevam como a Emilene. Não quero uma multidão de leitores, só quero os melhores possíveis.

    Rafael.

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